Despedida do Polo Azulão foi marcada pela resistência, o respeito e a valorização  

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Não é pela cor da pele. É pelo que as pessoas são e no que creem. E, neste caso, o que elas creem também demonstra muito o que elas são. Homens e mulheres que encontram nas religiões de matrizes africanas um elo com o divino também encontraram, nessa segunda (23), no Polo Azulão, um espaço de valorização das suas crenças e valores.

O tradicional Encontro dos Ogans fez com que o Polo Azulão fosse ocupado por dezenas de importantes representações de religiões como umbanda e candomblé de Caruaru e outros municípios. Representatividade que é importante para fazer com que cada uma e cada um presente no Polo Azulão pudesse ouvir, em iorubá – língua africana que desempenha um papel central no candomblé -, diferentes reivindicações de respeito.

“A noite de hoje foi voltada para ‘o ser afro’. Viemos aqui para fazer muita musicalidade negra, cantando e reverenciando os orixás, enfim, trazendo a liturgia do povo negro para o São João de Caruaru. Uma noite para movimentar e reunir pessoas de diferentes comunidades negras de toda a região”, destacou o Mestre Ogan Tetê.

Contudo, a pauta sobre respeito e a valorização ecoou no Polo Azulão também pelas vozes das três atrações seguintes. Começando por Gabriel Sá. Multiartista que, antes mesmo de começar a cantar, se posicionou firmemente em relação ao tema, através do figurino e dos adereços utilizados para o show (idealizados por ele mesmo).

Gabriel Sá levou para o Polo Azulão o show ‘7 Marias’ – um tributo à força e à presença feminina na música. O multiartista recebeu, durante a apresentação, as artistas Dayse Rosa, Adriana Sá, Fernanda Espíndola, Helena Cristina, Luana Tavares, Paulla Badú e Raquel Santa. Mulheres que o inspiram e o inspiraram a estruturar o projeto.

“Foi um prazer imenso apresentar ‘7 Marias’. Este projeto mostra a ancestralidade e a força do poder feminino dentro de uma festividade que se diz tão patriarcal – que é o São João. A gente sabe que Xangô caminha junto com Iansã, com Oiá, com o femino, com a mulher. Por isso, trazer essas sete mulheres para empoderar essa noitel”, destacou o Gabriel Sá.

Em sequência, o sambista Colibri Brasil, cuja voz se somou a das “Marias” para conciliar a alegria contagiante do samba com questões que merecem vez e voz e apareciam – explícita e implicitamente – em muitas das músicas que formaram o repertório do show.

“A principal mensagem do show de hoje foi a do combate à intolerância, ao racismo e ao preconceito. Foi trazer [para o palco] a essência da nossa ancestralidade e religiosidade, daquilo que foi trazido de uma forma escravocrata para dentro do nosso país e que, durante muito tempo, foi induzido ao esquecimento [as nossas raízes afrodescendentes]”, apontou Colibri Brasil.

E, para encerrar a noite com as bênçãos dos orixás, o Polo Azulão recebeu o grupo Filhos de Gandhy, com uma apresentação recheada de simbolismo e representatividade. Isso porque a história do grupo registra que ele foi fundado por estivadores portuários de Salvador (BA) – capital brasileira com as maiores proporções de população preta (34,1%) e preta e parda (83,2%). O que reflete, claro, na representatividade das religiões de matrizes africanas.

É o que destaca o vocalista de Filhos de Gandhy, Júnior Rasta. “É uma missão levar a mensagem de Mahatma Gandhi, tudo que ele representa. Nos faz entender que temos uma missão, de fato, uma missão de vida”, afirmou.

O silêncio dos tambores, após o término do show de Filhos de Gandhy, deu lugar à contagem regressiva para a próxima temporada de shows do Polo Azulão. E, claro, ao sentimento de que ela se pareça como essa última noite de shows: representativa, plural, diversa e marcada por muito respeito ao próximo.

*FESTIVAL ROCK AZULADO -* Nessa segunda (23), também foi divulgado o resultado do Festival Rock Azulado. Promovido pela Fundação de Cultura de Caruaru, o evento abriu espaço para que bandas de rock locais pudessem se apresentar a cada quinta-feira. Avaliadas por uma comissão julgadora especializada, as bandas concorreram ao prêmio de R$ 5 mil.

E, claro, muito mais que isso. Essa foi uma chance para que muitas delas se apresentassem pela primeira vez no Polo Azulão – e no próprio São João de Caruaru. É o caso da banda vencedora: Amanan. Que estreou em grande estilo, encantou os jurados e ficará eternizada como a ganhadora da primeira edição do Festival Rock Azulado.

“Nós ficaremos marcados como a primeira banda que tocou no Festival Rock Azulado, e também, claro, como os vencedores da primeira edição. Nós tivemos o privilégio de abrir este festival, que a gente espera que prossiga por anos”, comemorou o vocalista e guitarrista da banda, Edgard Carvalho, em tom eufórico, pouco depois da premiação.

*ALIÁS, FORAM 12 DIAS DE MUITA DIVERSIDADE -* Entre a sexta-feira, dia 29 de maio, e essa segunda-feira, dia 23 de junho, o Polo Azulão foi palco para 42 artistas. Entre estreantes e veteranos, de diferentes gêneros musicais, muito artista talentoso que abrilhantou, ainda mais, a programação do Maior e Melhor São João do Mundo.

Foram semanas marcadas por apresentações simbólicas para a cultura regional. Como, por exemplo, a da Banda de Pífanos Dois Irmãos, no dia 6 de junho, com o show ‘João do Pife: 70 anos de história’; e a da Banda de Pífanos de Caruaru (‘Os Bianos’), no dia 13 de junho – prestes a completar 101 anos de atividade -, que celebrou um legado que inspira gerações.

Mas o Azulão é gigante – o cantor e o Polo – e recebeu também grandes nomes da música brasileira. A exemplo da cantora e compositora Vanessa da Mata, no dia 13 de junho, que mobilizou uma multidão para cantar sucessos eternizados por ela e na voz dela, em uma carreira admirada por tantos daqueles que estiveram em um dos maiores públicos da história do Polo Azulão.

Os últimos dias reservaram encontros memoráveis, como o de Almério e Rogéria, durante o show de Almério, no dia 21 de junho, que protagonizaram um dueto nostálgico, que relembra o início e os tantos encontros que eles tiveram em diferentes palcos de Caruaru no início da carreira.

E, assim como canta o ‘Pequeno-Gigante’ Azulão, na música ‘Adeus minha rosa’: “Até para o ano, se ‘nois’ vivo for”!

Foto: Jorge Farias

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